Não é que eu deseje mal aos outros mas não pode acontecer tudo sempre ao mesmo.
Desta vez foi a Yonnie que ficou doente, uma infecção na garganta, algo simples e que com a ajuda do Zé Bastos ficava rapidamente resolvida. Mas não, não mesmo. Primeiro porque estamos na China, segundo porque não temos o Zé Bastos por cá, terceiro porque descobri o segundo Deus adorado pelos chineses.
Eu já sabia que os carimbos eram algo de sagrado, mas este desconhecia por completo. Eu, e a Yonnie, macaense a quem certamente estas coisas fazem confusão.
Fomos ao hospital mais recente de Shaoxing, The Shaoxing People´s Public Hospital, um edifício gigante, espaçoso e estranhamente limpo. Os corredores são tão largos, que podíamos facilmente organizar corridas de macas, com 8 participantes de cada vez. Ainda não perdi as esperanças de montar lá um banca de apostas....
Na entrada informaram-nos que tínhamos de seguir até ao 3º piso, pois eram aí as consultas E.N.T ( otorrinolaringologia) e nós como meninos civilizados e bem comportados, chegámos, sentámos e esperámos. A secretária do tipo que devia estar a coordenar as coisas estava vazia, e assim se manteve, o painel informativo desligado e não havia um local para retirar senhas de atendimento. 15 minutos depois, fiz-me de estrangeiro parvo e resolvi ir à procura dentro dos consultórios.
Primeira sala em que entro, são 4 consultórios juntos em regime de open space, mas só dois estavam em funcionamento. Era isto mesmo que procurava, alguém que nos atendesse, embora fosse expectável um pouco mais de privacidade. Estava eu a elogiar aquilo, a dizer que pelo menos não era como no banco, que atendem 4 ou 5 ao mesmo tempo, mas falei antes do tempo. Aparecem umas criaturas não sei donde, nem para onde, foram entregar uns papeis e levantar outros, suponho que fossem atestados ou receitas. E claro, a consulta da Yonnie ficou a meio. Mas claro, na China sem mirones, assistência, plateia e claque não se faz nada...
Dez minutos depois de entrarmos, e já com as interrupções contabilizadas, saímos com uma prescrição interessante. Uns comprimidos que nem são peixe nem são carne, nem são medicina tradicional chinesa, nem medicina convencional ( para não dizer normal!!!) e ainda uns frasquinhos de ampolas para tomar com SORO. Sim soro, esse elemento tão importante do quotidiano chinês, que ambos desconhecíamos.
Antes de irmos para a sala das transfusões - o nome dá logo alento aos pacientes - fomos escada abaixo e escada acima, novamente escada abaixo e escada acima para pagar e levantar os medicamentos. Por falar em pagamento, para um país comunista, e para um "hospital do povo" os tipos esticam-se à grande. Voltando às transfusões....
Foi necessário fazer um teste qualquer à pele, tipo reacção alérgica, como o braço não caiu disseram que estava tudo bem e que podia então começar com a dose de 500 ml de soro.
A sala de transfusões, este nome arrepia-me, era de bradar aos céus. Estavam certamente mais de 100 pessoas a levar soro, divididas em duas salas e a passear nos corredores e aposto que na sua maioria nem elas nem quem prescreveu o soro sabia o motivo. Mas o importante é o soro!!!! Claro que este processo é público e partilhado, na mesma mesinha colocam agulhas a 3 ao mesmo tempo, o que ainda dá mais animo.
Um tipo levar soro só porque tem uma dor de garganta já é bom, mas pior é ter uma dor de garganta e ser criança. Não só leva o soro, como ainda espetam a agulha na testa. Isto sim é um crueldade. nem aos toiros espetam as bandarilhas na cabeça....
Eu sou aquela pessoa que gosta de hospitais, e além de hospitais gosto de massas humanas ( vulgo ajuntamentos e carneiradas). A combinação dos dois, e tendo em conta que a massa humana era chinesa, devem ter uma pequena ideia do quanto eu estava a gostar daquilo.
Durante o tempo que passamos tivemos oportunidade de ver um pouco de tudo, nisto os hospitais chineses são melhores que os europeus, têm um sistema de animação e entretenimento nunca visto ( graças a Deus) noutro lado. Onde mais é que se consegue ver, num só sítio, numa só manhã, no espaço de uma hora e numa fila de bancos ( o nosso campo de visão):
- Uns 10 putos a fazerem xixi para o chão?
- Uns 2 ou 3 putos a fazerem cócó para o mesmo local?
- Umas criancinha a fazer xixi para cima da mãe e para o chão?
- Um a escarafunchar o nariz até encontrar o tico ( o teco pelo aspecto dele deve estar morto à muito...)
- Uma mãe a dar de mamamr à cria na cadeira ao nosso lado?
Pois é, estas coisas nem nos sistemas de saúde nórdicos são passíveis de encontrar, e penso que o ambiente hospital teria muito a melhorar com a implementação destas personagens. Relembro que tudo isto só é possível porque as calças das crianças não têm rabo, e não se usa cuecas, o que facilita os processos logísticos. Querem imaginar como é o chão desta sala??????
Na foto abaixo conseguem ver uma mãe que no fim do filho ter regado o chão todo monopolizou um balde só para ela ( sim, o balde é tipo sanita, mas sem autoclismo), podem ainda ver uma mãe com o filho ao colo no fim de tanto ela como uns quantos metros quadrados de chão terem sido regados, e se fizerem zoom vêm ainda as calças sem rabo.
Depois de uma manhã nisto, aparentemente sentiram-se resultados, mas não invalidou lá ir no dia seguinte para mais uma dose de soro, desta vez de 600 ml, e ainda de uma prescrição para o terceiro dia para dose igual. A sorte é que ela já lá não pareceu mais, caso contrário iria andar um mês todos os dias a levar soro, até ficar com as veias tipo coador.
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